IBGE organiza mobilização nacional para recensear comunidades quilombolas pela primeira vez
No último dia 17, o IBGE realiza o Dia de Mobilização do Censo Quilombola, inaugurando oficialmente o Censo Demográfico 2022 nessas comunidades pelo país. Toda a divulgação foi acordada com a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq). A data marca a apresentação da metodologia da operação censitária nessas áreas e pretende mobilizar as lideranças a abrirem suas comunidades para que a população quilombola responda ao Censo 2022.
“O grande objetivo é sensibilizar a população a responder o Censo Quilombola, o primeiro em que o IBGE vai poder oferecer para a sociedade como um todo estatísticas oficiais sobre quantos são, onde vivem e como vivem. É importante que essa população esteja preparada e sabendo que o IBGE está trazendo essa possibilidade de retratar sua realidade pela primeira vez. Outro objetivo é mobilizar as lideranças quilombolas para que abram suas comunidades e recebam nosso recenseador. O terceiro objetivo é visibilizar para a sociedade em geral essa grande novidade e avanço do Censo 2022: a inclusão de mais um dos povos e comunidades tradicionais” destaca a coordenadora do Censo de Povos e Comunidades Tradicionais do IBGE, Marta Antunes.
Um dos desafios foi definir a pergunta para que a pessoa entenda o questionário e possa se declarar quilombola para o Censo. Marta explica que a pergunta sobre pertencimento vai abrir em áreas pré-definidas de forma controlada geograficamente, considerando que se trata do primeiro exercício de retrato dessa população.
“O grande desafio de mapear a população quilombola em áreas pré-definidas foi da cartografia censitária. Além dos territórios quilombolas oficialmente delimitados – informação que recebemos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e dos institutos estaduais de terra –, procuramos retratar também todas as comunidades quilombolas fora desses territórios e todas as localidades onde pode haver população quilombola residindo”, diz Marta.
O trabalho de mapeamento identificou 5.972 localidades quilombolas e 2.308 agrupamentos quilombolas – aqueles em que há 15 ou mais pessoas residindo em um ou mais domicílios próximos espacialmente e nos quais as pessoas estabelecem laços de parentescos ou comunitários. O Censo visitará todos os territórios, comunidades e localidades quilombolas. As comunidades, domicílios ou localidades que eventualmente não tenham sido identificadas durante o mapeamento, serão incluídas nas bases de dados pelos recenseadores para estimativas de subnotificação.
Outra etapa importante foi desenhar o treinamento dos recenseadores. Para que as pessoas se sintam confortáveis em responder ao Censo, é importante que percebam que sua identidade e forma de organização social serão respeitadas. Para isso, foi necessário preparar os recenseadores para saberem lidar com a diversidade e alteridade, na chegada a um território ou comunidade quilombola. Além do treinamento de cinco dias dos recenseadores feito em todo o território nacional, no caso dos que vão recensear áreas quilombolas, houve um dia adicional em que todas essas recomendações foram passadas. Também obedecerão a protocolos de saúde como ausência de sintomas, uso de máscaras e álcool em gel.
“Também houve um trabalho de sensibilização das lideranças quilombolas e na coleta haverá reuniões de abordagem sempre que o recenseador chegar numa comunidade. No caso de ser necessário, as lideranças podem indicar o acompanhamento de um guia comunitário, quando o recenseador não é quilombola ou a área é de grande extensão”, completa Marta.
Retrato inédito
O Censo Demográfico vai produzir um retrato inédito da realidade dos quilombolas e suas comunidades. A pesquisa mostrará como vive a população quilombola, suas diferentes formas de organização social e enorme riqueza cultural. Com o censo o governo e a sociedade civil podem agir para buscar melhorar as condições de vida dessas comunidades. E para melhorar a coleta das informações e garantir o sucesso, nas comunidades quilombolas os recenseadores do IBGE vão procurar as lideranças locais para realizar uma reunião de abordagem, se apresentarem e explicarem o que é o Censo Demográfico. Vão solicitar também o apoio das lideranças e membros da comunidade para a realização da coleta. Em seguida, os recenseadores vão visitar todas as casas para realizar as entrevistas com as famílias residentes.
É importante destacar que todas as informações são protegidas e só o IBGE tem acesso. Depois de encerrada a fase de visita às casas, o IBGE reúne todas as informações, garantindo que as pessoas que participaram do censo não sejam identificadas. As informações são apresentadas sem nenhuma identificação para a sociedade.
Marta destaca que, no caso dos territórios oficialmente delimitados, será aplicado majoritariamente o questionário da amostra (77 perguntas). Isso para que seja possível apresentar informações o mais detalhadas possível com dados de educação, trabalho, deficiência, e outras informações que só constam no questionário amostra.
“Todo o projeto de como seria o censo nessas comunidades foi alvo de consulta e participação da organização da sociedade civil que representa as comunidades quilombolas – a Conaq – e de cooperação institucional com os órgãos do governo federal que atuam na política quilombola: a Secretaria Nacional de Política de Promoção da Igualdade Racial (SNPIR), o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), a Fundação Cultural Palmares, os institutos estaduais de terras, o Ministério da Educação e o Ministério da Cidadania com o Cadastro Único. Todas essas organizações apoiaram o processo de definição da metodologia censitária para a população quilombola”, esclarece a coordenadora.
Vale destacar que o Censo Demográfico, por se tratar de ato administrativo do Estado brasileiro com impacto na população quilombola, é sujeito à Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho, e, por isso, o IBGE observa a necessidade de consulta livre, prévia e esclarecida a essa população.
Para o Censo, o IBGE realizou consultas desde 2018 quando foi apresentada como seria a inclusão da população quilombola e os primeiros resultados dos testes sobre perguntas que funcionariam ou não para retratar a população quilombola.
Autoidenficação
Em respeito à Convenção 169 e, de forma coerente às boas práticas de produção estatística, o IBGE considera quilombola toda pessoa que se autoidentifica como quilombola assim como sobre as pessoas ausentes no domicílio no momento do recenseamento. O recenseador perguntará “Você se considera quilombola?”. Em caso afirmativo é feita uma segunda pergunta: “Qual o nome da sua comunidade?”. Por comunidade quilombola, o IBGE considera o que está definido no Decreto 4887 de 2003, que define que comunidade quilombola são grupos étnico-raciais de autoatribuição com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida.
Na segunda etapa de consulta, a partir de acordo entre o IBGE e a Conaq, foi definida a metodologia mista de levantamento das comunidades, envolvendo a abertura da pergunta de pertencimento de modo restrito a áreas pré-mapeadas e, para áreas não mapeadas previamente, o registro da localidade quilombola. Foram firmadas parcerias com todos os órgãos e com as lideranças quilombolas para se registrar toda área identificada. Nas terceira e quarta consultas, foram feitas a revisão da cartografia censitária e a definição do treinamento diferenciado.
“Considerando que havia lideranças de todo o país, identificamos a necessidade de realizar seminários estaduais para enraizar esse processo informativo e todos os acordos de consulta. Entre janeiro e março de 2022, realizamos 24 seminários nas 24 unidades da federação onde temos população quilombola, explicitando tudo o que foi definido. Nesse trabalho tivemos também a observação internacional, por meio do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) para garantir que tudo cumprisse o que foi definido na Convenção 169. E houve outros formatos de consulta em todas as etapas do censo. No caso do questionário, fizemos oficinas nacionais com base no teste realizado em 2017 em cinco comunidades da Região dos Lagos como a comunidade quilombola Maria Joaquina, em Cabo Frio, no Rio de Janeiro”, acrescenta Marta.
Durante a coleta, será concretizada mais uma etapa do processo de consulta quando, na chegada à comunidade, o recenseador procura as lideranças responsáveis e faz uma reunião de abordagem para explicar como será o censo e as áreas de trabalho e pede apoio e colaboração para sensibilizar a população a responder ao censo.
“A divulgação dos resultados do Censo também será negociada na etapa pós-censo, em reuniões e oficinas nacionais para chegar aos melhores formatos que atendam à população quilombola”, conclui Marta.
O Censo Demográfico é a única pesquisa oficial de levantamento da população quilombola e, em 2022, esse levantamento será realizado pela primeira vez. A participação das comunidades quilombolas é fundamental para a qualidade da pesquisa, de modo que os resultados reflitam a realidade das comunidades. Todas as comunidades serão visitadas por recenseadores que estarão uniformizados, com colete, crachá e boné. Todas as informações prestadas são sigilosas e possuem finalidade exclusivamente estatística.