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Teste irá permitir detecção pouco invasiva de micrometástases

Ter a capacidade de identificar micrometástases em pacientes oncológicos pode ser um diferencial importante no tratamento. Em muitos casos, pode evitar intervenções invasivas e ajudar a manter a qualidade de vida.

 

Uma solução desenvolvida pela startup Clyons Diagnóstica pode ajudar a atingir esse objetivo em pacientes com câncer bucal. A startup está elaborando com apoio do programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), da FAPESP, um teste capaz de detectar uma biomolécula relacionada à presença de micrometástases de câncer bucal de célula escamosa. “Conseguimos fazer a prova de conceito e já estamos colhendo alguns frutos”, conta o químico Thiago Prado, cofundador da empresa.

A prova de conceito, obtida em amostras sintéticas, simula a presença da biomolécula em organismos vivos. Segundo o pesquisador, a equipe agora trabalha em um teste-piloto para estabelecer um produto mínimo viável (MVP) no ambiente hospitalar.

Para isso, estabeleceu um acordo de cooperação com o serviço de cabeça e pescoço do Hospital de Amor e a Harena Inovação, ambos em Barretos. “Nossa expectativa é fazer a validação clínica analítica em amostras de pacientes”, afirma Prado. “Isso vai envolver os cirurgiões de cabeça e pescoço e os profissionais do Departamento de Patologia e do Núcleo de Ensino e Pesquisa do Hospital de Amor.”

Essa validação clínica analítica tem como objetivo aplicar a metodologia da Clyons em um ambiente controlado — nesse caso, as amostras de pacientes da unidade de saúde parceira. “Nessa etapa, vamos comprovar a presença do marcador no paciente, algo fundamental para lançar um produto de saúde no mercado”, explica Prado.

Os pesquisadores buscam proteger a propriedade intelectual da criação e já começaram a redigir a patente sobre a tecnologia.

Pouco invasivo

De acordo com Prado, é comum que, em pacientes com câncer no andar inferior da boca ou no pescoço, haja a retirada do linfonodo sentinela ou o esvaziamento eletivo de todos os linfonodos do pescoço. “Em 70% a 80% dos pacientes que passam por esse processo, não são encontradas metástases e o indivíduo poderia ser preservado”, avalia Prado.

Muitas vezes, o procedimento é irreparável e afeta o sistema linfático do pescoço e a musculatura da região. “E ainda pode causar paralisia, perda de movimentos do ombro, alteração da voz e no paladar, dificuldade de engolir e outros — ou seja, tem potencial de afetar muito o bem-estar do paciente. Isso sem contar os custos envolvidos.”

Por outro lado, em tumores iniciais, pode ocorrer a opção pelo acompanhamento e, algumas vezes, é detectado o avanço da doença por não haver uma investigação mais aprofundada. “Em 20% a 30% dos casos, constata-se a existência de micrometástases que não foram averiguadas e o indivíduo é diagnosticado com metástase cervical, já em fase avançada.”

O teste proposto pela Clyons, por sua vez, é pouco invasivo em comparação com os procedimentos cirúrgicos, além de ser bastante sensível e preciso. Dessa forma, pode ser usado em pacientes em diferentes estágios da doença. A partir de uma punção no linfonodo, os pesquisadores obtêm uma amostra bem representativa da região — algo que pode não ser possível ao coletar material para um exame de anatomopatologia, por exemplo.

A detecção precoce de micrometástases pode mudar a conduta em relação ao tratamento. A tecnologia é tão promissora que Prado explica que a startup pretende, no futuro, adaptar o processo de identificação da biomolécula para outros tipos de câncer. “É o caso, por exemplo, de câncer de mama e de tireoide, entre outros.”

Auxílio diagnóstico

Prado destaca que a tecnologia da Clyons é tão sensível e precisa quanto outras disponíveis no mercado, mas tem menos etapas de processamento da amostra. Com isso, há diminuição de tempo e custo para chegar ao resultado. “Para aplicação no diagnóstico de doenças, é uma solução incremental: vai ser uma informação a mais para auxiliar na conclusão sobre o estado clínico do paciente.”

Durante o processo, faz-se a captura do biomarcador em fase sólida e, depois, sua liberação em meio líquido para detecção. Nesse processo, as reações bioquímicas ocorrem em um ambiente heterogêneo (sólido/líquido), que permite fazer pré-concentração da biomolécula. O cientista pontua que isso aumenta a sensibilidade do método de análise.

Saúde pública

Segundo Prado, o câncer bucal é um assunto de atenção de saúde pública, principalmente para o Sistema Único de Saúde (SUS), porque tem como fatores de risco o etilismo e o tabagismo. “Grande parte da população brasileira tem os hábitos de fumar e de consumir bebida alcoólica”, destaca.

Dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca) apontam que, entre 2023 e 2025, devem surgir 118.650 casos de câncer de cabeça e pescoço no país — uma média de 39.550 por ano. De forma geral, a doença está entre as dez mais prevalentes na categoria. Em homens, o câncer da cavidade oral é o quinto mais comum. Já em mulheres, traqueia e tireoide ocupam a quarta e a quinta posições, respectivamente.

Em longo prazo, os cientistas projetam a possibilidade de identificar biomoléculas em sangue periférico, por meio de biópsia líquida. “Isso vai permitir detectar doenças de forma sistêmica — não só pontuais em focos de metástase.”

A expectativa da equipe é ter um MVP em, no máximo, dois anos. “Depois, existem alguns processos de transição da tecnologia da pesquisa para o desenvolvimento para o mercado. É o caso, por exemplo, da aprovação pelo órgão regulador: nós não temos controle sobre o tempo de liberação desse registro.”

Da universidade para o cotidiano

A Clyons foi fundada em junho de 2022 e a iniciativa buscava aprimorar e aplicar os conhecimentos que os pesquisadores adquiriram na trajetória acadêmica. “O projeto de diagnóstico de uma molécula relacionada a câncer de cabeça e pescoço foi iniciado na universidade e atualmente damos seguimento a ele aqui na empresa”, conta Prado. “Nossa experiência sempre envolveu a investigação de biomoléculas relacionadas a essa doença.”

Até o nome da startup vincula a pesquisa acadêmica ao dia a dia. Isso porque se trata de uma homenagem aos pesquisadores que descobriram os biossensores: o bioquímico Leland Clark e o microbiologista Champ Lyons. Eles desenvolveram o primeiro biossensor em 1962 e a pesquisa levou à criação do glicosímetro — que permite o controle da glicemia, especialmente em diabéticos, diariamente em todo o mundo.

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